Há 165 anos, nascia um projeto ambicioso em termos de mobilidade e tecnologia: uma linha férrea que queria ligar o Recife a Paulo Afonso, na Bahia. Embora não tenha alcançado o seu objetivo inicial, a Recife and São Francisco Railway Company marcou época e foi a primeira linha férrea do Nordeste – e a segunda do Brasil.
Em 1852, uma lei no Brasil passou a dar isenções de impostos e garantia de juros sobre o capital investido na construção de estradas de ferro. Isso despertou o interesse das companhias gringas, sobretudo das inglesas. É o caso da Great Western, que se instalou no Nordeste.
A primeira linha férrea do Brasil foi iniciativa do Barão de Mauá, sendo inaugurada no Rio de Janeiro em 1854. Dom Pedro II, um entusiasta das novidades tecnológicas, esteve presente na primeira viagem numa locomotiva chamada Baroneza.
A primeira estrada de ferro de Pernambuco teve concessão dada em 1852, mas não saiu do papel por dificuldades. O Império interveio e constituiu no estado a Companhia Britânica, que construiu a Recife and São Francisco Railway Company.
A ideia inicial era chegar até às cachoeiras de Paulo Afonso (BA). Esse traçado original foi alterado, mas a linha não mudou de nome. Tanto que a estação do Recife era chamada de “São Francisco” e ficava no Forte das Cinco Pontas.
A ferrovia foi inaugurada em 1858. O seu trecho inicial tinha 31,5 km, numa linha Recife-Cabo, com paradas em Afogados, Prazeres e Pontezinha.
No começo eram dois trens diários em cada direção: do Recife-Cabo, às 9h e 17h; e do Cabo para a capital, às 7h e 15h. As passagens de 1ª classe custavam 4 mil réis. De 2ª e 3ª, 3 mil e 1500 réis. Nessa época, viajar para o Cabo virou moda entre muitas famílias.
“Nenhum outro entretenimento se comparava ao dessa excursão num cômodo banco de carruagem puxada por locomotiva possante, vendo-se pela janelinha canaviais e cajueiros, praias e coqueirais, mangues e colinas”, escreveu Mário Sette.
“E o povo do mato ao longo da linha de olhos compridos ou assustados para a carreira da composição! Era uma pena quando se chegava! Tão depressa!”.
O destino das famílias mais abastadas era o Grande Hotel do Cabo, uma bela e grande casa com bastantes salas e quartos, “belo banho, ótimo jardim e uma banda de música militar” que tocava no intervalo dos divertimentos.
Em 1859, o trem recebeu os imperadores D. Pedro II e Teresa Cristina, que faziam uma visita a Pernambuco. Eles usaram a linha para visitar o Cabo três vezes: em 1º/12 para passagem rápida, 10/12 para visita oficial e 21/12, quando o imperador visitou Escada a cavalo.
Ao longo dos anos, a linha ganhou expansões. Primeiro, chegou até a cidade de Escada. Naquele Pernambuco rural, o progresso causou conflitos. Os ingleses compraram brigas com senhores de engenho, incomodados com os desmatamentos do plantio causados pelas obras.
A companhia inglesa obtinha as áreas quase de graça e os grandes proprietários rurais recorriam à Justiça. Os ingleses quase sempre saiam vitoriosos, já que os governos imperial e provincial tinham interesse na estrada.
Em 1862, a linha chegou até Frecheiras e Água Preta. Depois foi a vez de Una, atual Palmares. E ali parou, com 125 km. Nunca chegou ao destino final, mas ajudou a desenvolver as cidades por onde os trilhos passaram.
Emannuel Bento é jornalista pela UFPE, com passagens pelo Diario de Pernambuco e Jornal do Commercio
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