Recife possui a única torre de atracação de zeppelings ainda de pé no mundo. Há mais de 90 anos, ela integrou a da primeira estação aeronáutica para esse tipo de transporte na América do Sul.
O zeppelin era uma das tecnologias mais fascinantes do mundo no começo do século 20. Eram como balões movidos com o motopropulsor, criados a partir dos investimentos do conde alemão Ferdinand Von Zeppelin – cujo nome batizou esse tipo de veículo.
Ao chegar em terra firme, o dirigível precisava ficar amarrado numa “torre de atracação”, onde ele permanecia parado para o embarque e desembarque de passageiros. O pináculo do Empire State Building, em Nova York, foi originalmente projetado para servir como mastro de amarração para zeppelin.
Os zeppelins foram usados pela Alemanha para bombardeios na Primeira Guerra Mundial. Após a derrota no conflito, o país foi proibido de construir as naves até 1926. Na retomada, foi iniciada a construção do Graf Zeppelin, um orgulho da engenharia alemã, para viagens comerciais.
Na década de 1930, o Graf Zeppelin já rodava todo o mundo e estava prestes a chegar na América do Sul pela primeira vez. A vinda para o Brasil tinha um objetivo diplomático e também servia de propaganda para a Alemanha.
O Recife, uma das três maiores metrópoles do país na época, foi escolhido para ter a primeira estação a partir de grandes esforços do Governo de Pernambuco e da Prefeitura do Recife. O poder público optou pelo bairro do Jiquiá para as instalações.
O Jiquiá, que ainda era uma espécie de área rural do Recife, recebeu uma grande reforma para nivelação de um terreno de 500 mil metros quadrados e melhoramento das estradas de acesso, o que ajudou a urbanizar aquela área. Foi, então, instalada no local, a torre de atracação de 16 metros de altura.
A primeira vinda do Graf Zeppelin foi um grande acontecimento na cidade. O “Campo do Jiquiá”, como ficou conhecido, recebeu até arquibancadas para quem quisesse acompanhar o primeiro pouso do zeppelin. Existiam ingressos para entradas de pedestres e automóveis, como um espetáculo.
A rota do Graf Zeppelin até o Recife começava por Friedrichshafen, na Alemanha, passando por Sevilha, Marrocos, Ilhas Canárias e Cabo Verde. Essa foi a primeira vez que ele cruzou a Linha do Equador numa viagem que durou 48 horas.
Em 22 de maio, o Recife parou para ver o dirigível. Ele chegou por volta das 18h no Campo do Jiquiá. Quando próximo da aterrissagem, ele precisava ser puxado por cordas para ser amarrado na torre. Aqui, mais de 300 soldados fizeram o serviço. Esse momento é registrado no documentário “Flying Down To Rio”, de 1932, que mostra exatamente como era um pouso no Recife.
O Graf Zeppelin pôde receber visitas no Jiquiá. O ingresso custava 5 mil réis para entrar no campo e apenas ver de longe. Para se aproximar e ver por fora como era dentro, 10 mil. As visitas internas só eram possíveis para um número restrito de pessoas, a convite do comandante.
A viagem para o Brasil também contou com passagens pelo Rio de Janeiro (onde passou apenas duas horas, o que causou uma decepção na cidade), sobrevoando ainda São Paulo e Santos, depois retornando ao Recife em 26 de maio.
O sucesso da viagem estimulou a criação de uma linha regular entre Friedrichshafen e Recife até 1937. Foram feitas 63 viagens com atracação na torre do Jiquiá, colocando o Brasil na rota global dos dirigíveis e consolidando o Recife como uma cidade moderna e cosmopolita.
Em 1933, Adolf Hitler assumiu o poder na Alemanha e o Graf Zeppelin passou a integrar a propaganda do regime nazista, quando uma suástica foi incluída em sua calda. Os nazistas também construíram o dirigível Hindenburg, que chegou a vir pro Brasil seis vezes.
O Hindenburg pegou fogo num acidente em 1937, durante pouso em Nova Jersey, nos EUA. Os dirigíveis já estavam obsoletos em função dos avanços dos aviões e helicópteros. O alto custo para mantê-los, além do risco de acidentes com o gás de hidrogênio, decretaram o fim da era dos dirigíveis.
Após mais de 90 anos, a vinda do Zeppelin permanece como uma memória do progresso no Recife. Até onde se sabe, a Torre de Amarração do Jiquiá é a única ainda de pé no mundo.
Ao longo dos anos, a torre passou por processos de degradação, mas vem sendo restaurada, a exemplo do trabalho feito pelo artista Jobson Figueiredo – concluído em 2013. Esse objeto é uma peça fundamental para a cultura, história, ciência e turismo do Recife, devendo ser preservado por várias gerações.
Emannuel Bento é jornalista pela UFPE, com passagens pelo Diario de Pernambuco e Jornal do Commercio
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