Por Silvia Bessa
Durante as férias no exterior, ela abrirá as portas de um imóvel amplo, com uma bela piscina, enquanto grelha um pedaço grande de um churrasco suculento. Bem passado, malpassado ou no ponto? Os convidados podem até estar vestidos de casacos porque o frio será até uma atração para os visitantes. Todos estão rindo, desfrutando a paisagem de fundo do quintal de uma cidade acolhedora do interior da Inglaterra ou da Irlanda, ou um bairro de Londres ou Dublin. “Misericórdia, chega me arrepio quando penso”, conta Samara Silvia Sabino, estudante do Programa Embarque Digital da turma 2021.2. A cena não é uma produção cinematográfica, dessas que a jovem acompanha no final de semana. Tampouco parece, para ela, distante.
Samara se vê abrindo a porta dessa casa e seguindo em uma espécie de tour, guiando aqueles que ali estarão pela primeira vez. O ponto alto da apresentação da residência será a biblioteca. “A casa precisa ser enorme porque eu quero muito uma biblioteca como aquela da Bela e a Fera, lembra?”. Todos os clássicos estarão lá, enfileirados e limpos. E não será com demora: daqui a pouco tempo – quem sabe nos próximos cinco anos. Excêntrico ou exagerado o plano? Que importa, é o dela.
Como estudante do Embarque Digital, ela precisará preencher um dos requisitos do programa: ao final da formação, deverá trabalhar em uma empresa com sede no Recife por pelo menos 30 meses (dois anos e meio). A cláusula é comum em iniciativas desse tipo e funcionam como contrapartida social para cidade.
Samara conta que, por ser estudiosa e até metódica em entregas de trabalhos, por vezes era excluída de grupos ou disputada apenas por representar aquela que “sempre entregava” suas atividades, nunca se sentiu “encaixada” em um grupo e nem sentiu vontade de “se encaixar” até se deparar com pessoas que gostam do mesmo que ela: de compartilhamento de ideias, de estudo e de tecnologia. No Embarque, encontrou todos esses atrativos juntos.
“Sempre me vi viajando e a curiosidade é uma característica minha desde pequena, então acho que a tecnologia me atraiu nesses dois sentidos”. Samara mora no bairro do Ibura, periferia da Zona Sul do Recife, bem perto da ladeira da Cohab e da Policlínica. Filha de uma chefe de cozinha e de um pai afetivo que é segurança. Juntos, eles a criaram desde bebê. Samara completou 19 anos, faz um estágio na empresa Bidweb Security IT, está esperançosa de ser contratada ao final do estágio e construir uma carreira. Esbanja confiança de que logo poderá receber quem quiser na sua casa no exterior, a começar pela mãe Taciana, o pai Cláudio, e a irmã Maria Eduarda.
Ao comentar suas preferências, costuma usar a honestidade: prefere a Europa, mas segue aberta para possibilidades porque “está se experimentando”, gosta muito de se “explorar”, conhecendo áreas diferentes e sabe que a sua inserção no ecossistema tecnológico do Porto Digital, com a bolsa concedida pelo Embarque Digital e a PCR, ainda vai lhe abrir muitas portas e janelas – muitas das quais, impensáveis.
“Quem sabe Canadá ou Estados Unidos? Topo tudo”. Ela é um exemplar típico de jovem estudante de tecnologia, que faz de sua própria carreira um experimento, enquanto vai descobrindo e ponderando as suas soft skills (as habilidades e características subjetivas da sua personalidade) e as suas as hard skills (competências do perfil profissional).
Atualmente, a carreira que mais lhe atrai é a na área da perícia criminal. Explica-se: acumulando boas notas nos boletins escolares desde o fundamental e da Escola Técnica Advogado David Rodrigues (época em que brigava com o professor por dois décimos), Samara cogitava seguir pelo ramo do Direito ou da Medicina. Depois, avaliou melhor e lembrou que a curiosidade lhe colocava na pré-condição de investigadora em construção.
Prestes a completar o 4ª período do curso do Embarque Digital, tentou outro curso na UFPE. “Quero linkar os dois”. Foi aprovada no final de 2022 para cursar uma vaga de Biomedicina, na Universidade Federal de Pernambuco. Começa agora, dia 23 de outubro, com o início do semestre letivo da UFPE. Admite que pode se encantar por outra carreira durante o processo e que nada seria inesperado, desde que se mantenha com foco.
Samara quer conhecer as “possibilidades” sobre as quais tanto fala para ter condições de fazer melhores escolhas na aplicabilidade da tecnologia “a serviço da sociedade”. “Vivemos em uma sociedade”, para então citar grandes invenções do mundo moderno, como o telefone e as redes sociais. “É só lembrar da época da pandemia”, frisa. Ela não perde oportunidades de avançar no acúmulo de conhecimentos.
Prestes a se submeter ao Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), já pensava assim: nos finais de semana, via filmes e mais filmes da Marvel ou DC, lia filósofos e sociólogos, preocupada em formar “repertórios” para uma redação atrativa para a banca examinadora. Quando tentou o Enem pela primeira vez, surpreendeu-se com a excelente nota 900. Era o fruto daquele empenho de vários anos, sobretudo o de 2020, em que ela usou as limitações das medidas sanitárias da pandemia para ler um livro por semana. Com a nota na casa de 900 em redação, viu que tinha potencial. Na segunda vez, agora em 2022, alcançou a nota 920 na redação.
A chamada para a concorrência de uma vaga no Porto Digital veio pelo incentivo da mãe, que viu um anúncio nas redes sociais e achou o curso tal qual aquilo que a filha mais gostava – tecnologia. “Eu nunca me conformei em apenas ver um ventilador. Sempre quis saber como ele e outros objetos funcionam”. Taciana, a mãe de Samara, diz que a jovem nunca foi superdotada, mas inteligente e dedicada. E que sempre contou com o apoio da família.
No dia que saiu o resultado com a aprovação, elegendo Samara para uma das vagas do Embarque Digital, a família resolveu sair e comemorar. “Fomos todos para o Recife Antigo. Tomamos caldinho de camarão, andamos pelas ruas no sol quente de meio dia e fizemos muitas fotos num domingo”, lembra Taciana, orgulhosa. “Eu fiz ligação para a família dizendo da novidade e falando como Samara estava chique porque estudaria com o pessoal do Porto Digital”. Foi dia de grande alegria; por coincidência, tudo ali lembrava o Porto Digital – uma vez que o maior parque tecnológico da América Latina tem a distribuição geográfica e aberta pelas ruas do Recife Antigo.
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Silvia Bessa é jornalista. Gosta de revelar histórias que se escondem na simplicidade do cotidiano. Venceu três vezes o Prêmio Esso e tem quatro livros publicados
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