Há mais de 100 anos, quem circulava pelo Recife podia se deparar com antigos arcos construídos nos tempos dos holandeses. Infelizmente, pela discussão ainda escassa sobre patrimônio naqueles tempos, essas edificações foram destruídas quando tinham mais de 300 anos.
A história dos arcos dialogam com a chegada dos holandeses em Pernambuco nos anos 1630, que provocou intensas transformações urbanas no Recife – muito por iniciativa de Maurício de Nassau. Dentre as novidades estava a construção de uma ponte que ligava os atuais bairros Recife Antigo e Santo Antônio.
Entre as extremidades da ponte (que hoje é a Ponte Maurício de Nassau) foram construídas portas. A porta que ficava do lado do Recife Antigo se chamava Porta da Ponte – ou “Pontpoort”. Já a outra porta ficava no atual bairro de Santo Antônio, na entrada da nova “Cidade Maurícia”.
Elas tinham duas funções principais: segurança, controlando a passagem de pessoas, e cobrança de pedágio pelo uso da ponte – com o objetivo de custear os investimentos da construção. Ao entardecer as portas eram fechadas, impedindo que se entrasse na Cidade Maurícia à noite, a não ser que apresentassem uma “senha”.
No Recife Antigo, ainda existia uma outra porta que ficava na atual Rua do Bom Jesus. Essa seria uma porta de entrada pelo Norte do Recife, usada sobretudo por quem vinha de Olinda.
Quase 100 anos após a expulsão dos holandeses, em 1742, os portugueses realizaram uma reforma na cidade e remodelam essas construções, aproveitando os seus pilares de pedra. Elas deixaram de ser portas e se tornaram arcos.
Os arcos recebem imagens religiosas que dão os nomes de cada um: Arco de Santo Antônio (no bairro de Santo Antônio); Arco da Conceição (atual Marquês de Olinda) e Arco do Bom Jesus (na Rua do Bom Jesus).
O Arco da Conceição costumava receber festas religiosas como missas, novenas e som de bandas, principalmente em veneração à Nossa Senhora da Conceição. “Continuam extraordinariamente concorridas as novelas do Arco. Foram assim toda a noite diversas bandas de música. A festa promete ser espendida”, publicou o Diario de Pernambuco em 19 de novembro de 1898.
Embora tivessem perdido suas funções de porta, os arcos existiam harmonicamente com o Recife. Eram um diferencial na paisagem, até que começam novas mudanças urbanas…
O primeiro a ser derrubado foi o Arco do Bom Jesus, em 1850. O Governo da província de Pernambuco autorizou a destruição para dar espaço às construções do Arsenal da Marinha e desimpedir a comunicação de ruas.
Nos anos 1910, começam as reformas do Recife Antigo, que levaram abaixo um incontável patrimônio histórico e arquitetônico dos tempos coloniais. Nesse contexto, os arcos começaram a ser vistos como entraves da circulação dos bondes elétricos. +
A demolição do Arco da Conceição ocorreu junto com a igreja Matriz do Corpo Santo, em 1913. Ele tinha 268 anos quando foi derrubado.
O arco de Santo Antônio veio abaixo quatro anos depois, quando tinha 272 anos. Naquela época, a discussão sobre patrimônio histórico ainda não era tão avançada, mas os ocorridos comoveram intelectuais que futuramente fundariam o Museu do Estado de Pernambuco.
Caso ainda existissem, sem dúvidas os arcos seriam pontos turísticos e motivos de orgulho de uma cidade tão rica de histórias. Em 2022, a Prefeitura inaugurou uma placa com QR Code para que seja visto o Arco da Conceição em realidade aumentada por celulares.
Emannuel Bento é jornalista pela UFPE, com passagens pelo Diario de Pernambuco e Jornal do Commercio
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