Empresas vêm mudando a forma como se posicionam e como se estruturam internamente de acordo com características dos respectivos mercados, concorrência, localização geográfica, questões regulatórias e políticas. Há companhias que se posicionam como ecossistemas, um conjunto de redes de atores – usuários, clientes, fornecedores, produtores, operadores logísticos, dentre outros – interagindo de forma estruturada, geralmente, através de plataformas digitais responsáveis pela orquestração desses múltiplos agentes.

Bons exemplos estão em abundância como Amazon, Alibaba, Mercado Livre, Magazine Luiza, iFood, Uber, Itaú, dentre outros. Por que esse reposicionamento pode ser valioso? Como podemos nos inspirar em exemplos relevantes? O que foi feito nesses casos? Iremos abordar um caso interessante de empresas com posicionamentos relevantes de mercado que estão se reinventando como ecossistemas e crescendo.

O caso em questão é o da cervejaria brasileira AmBev, do grupo AB InBev – o maior do mundo, com uma fatia de 30% do mercado mundial segundo a Statista –, a qual precisou se reinventar durante a pandemia de 2020. Com a crise sanitária instalada e os protocolos de distanciamento social, uma parcela significativa dos canais de venda dos produtos da empresa – bares e restaurantes majoritariamente – foram fechados. Como a empresa iria lidar com essa mudança repentina de comportamento induzida pelas ações de combate à pandemia adotadas pelas autoridades?

A AB InBev tem uma unidade de inovação, a ZX Ventures, onde startups são incubadas, investidas e aceleradas pela companhia. Uma delas é o Zé Delivery, criada em 2015 com o objetivo de ser uma plataforma de venda de bebidas B2C do grupo, mas sem saber exatamente como – “Começamos há seis anos, sem ter uma ideia de onde iríamos parar, mas precisávamos entender como vender diretamente ao consumidor da América Latina.” – conforme descrito por France Roy, CTO da unidade de vendas diretas da AB InBev, em reportagem para a Forbes em 2022.

Considerando os números de 2019, o ano pré-pandemia, o Zé Delivery registrou 1,6 milhão de pedidos, saindo de 20 mil pedidos mensais em janeiro para 350 mil em dezembro. A partir de abril de 2020, os pedidos mensais passaram a marca de 1 milhão de pedidos, totalizando 27 milhões no ano, o que representou um crescimento interanual de quase 1700%, conforme descrito no estudo de caso feito pela equipe da AWS, plataforma de serviços da web da Amazon, onde as aplicações do Zé estavam hospedadas. Quem quiser saber mais, acesse o estudo neste link.

Conforme vivenciamos, a pandemia impulsionou um movimento sistêmico de transformação digital dos mercados, em especial, do varejo. O iFood, líder de mercado de delivery online no país, passou de um patamar de 20 milhões de vendas mensais em 2019 para 60 milhões por mês em 2021, conforme dados fornecidos pela própria companhia. Atualmente, temos em torno de 65 milhões de pedidos por mês, ou seja, mais de 2 milhões de pedidos diários em média, em 1700 cidades contando com 300 mil estabelecimentos parceiros e 60 mil mercados.

Com diversos aplicativos de entrega digitais disponíveis como o iFood e o Rappi, qual foi a sacada do Zé Delivery para crescer no meio desses gigantes? Esse caminho foi trilhado com bastante experimentação e estudos sobre o comportamento dos clientes e dos fornecedores. 

No Zé, as bebidas são geladas, com preço definido pela plataforma – os quais são relativamente próximos aos preços de venda dos supermercados –  e devem ser entregues em até 35 minutos após o processamento do pedido, atributos valorizados pelos clientes. A plataforma promete um markup mínimo de 20% no preço dos produtos e tem uma taxa de recompensa por entrega realizada abaixo da meta de 35 minutos, segundo descrito por Rafael Antunes, Head de Operações do Zé Delivery, para o portal TechTudo em agosto de 2022.

De acordo com o relatório anual da AB InBev de 2022,  o Zé Delivery atingiu uma marca de 62,4 milhões de vendas no Brasil, representando um crescimento no total de mercadorias vendidas (GMV) de 13% em relação ao ano anterior, mantendo 4,8 milhões de usuários ativos. Outro ponto de destaque é o seguinte: 41% das vendas vêm de garrafas retornáveis, o que contribuiu para o grupo atingir o  patamar de 77% dos vasilhames retornáveis ou feitos por materiais reciclados. O AB InBev tem como meta para 2025 atingir o patamar de 100% dos vasilhames retornáveis ou feitos majoritariamente de materiais reciclados.

Esses números impressionantes mostram como o olhar centrado no consumidor final possibilitou um crescimento de vendas e um reposicionamento da empresa num momento crítico com a pandemia. Contudo, isso só foi possível porque a AB InBev também investiu para otimizar a relação com os estabelecimentos de venda de produtos. 

Neste contexto, destaca-se a BEES, plataforma B2B, ativa em 20 mercados diferentes, representando em torno de 63% das receitas por canais B2B do grupo, com 3,1 milhões de usuários ativos mensais e GMV de 32 bilhões de dólares, o que representou um crescimento de 60% em relação a 2021. Outro ponto interessante é que a satisfação dos clientes da BEES, medida através do NPS, atingiu o maior patamar da série histórica no 4º trimestre de 2022.

Ou seja, o caso da AmBEV / AB InBev nos permite apreender uma série de lições onde o posicionamento da companhia com um ecossistema, com uma cultura de aprendizado contínuo e um mindset de inovação, ativado por uma forte relação com startups, contribuiu para o crescimento da companhia e para o ganho de produtividade.

Quer continuar essa discussão? Inscreva-se no debate Empresas como ecossistemas: Como aproveitar oportunidades entendendo o comportamento dos clientes, com a participação de Daniel Ackerman (Diretor do Alibaba Group) e Andréa Lyra (Diretora de marketing do Grupo Moura). O evento vai ocorrer no dia 26 de abril de 2023 às 16h. Participe!

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