Um espigão modernista no berço do Recife. Assim podemos resumir o impacto visual do prédio do Núcleo de Gestão do Porto Digital (NGPD), no Cais do Apolo. 

Inaugurado em 1970 como nova sede do Banco do Estado de Pernambuco (Bandepe), o prédio cinza de 20 andares é um contraste com o padrão arquitetônico da ilha, formada – em sua maioria – por prédios ecléticos do começo do século 20 – construídos na ocasião da grande reforma urbana do bairro.

Prédio do Núcleo de Gestão do Porto Digital quando era a sede do Bandepe, nos anos 1970 – Crédito: Acervo Acácio Gil Borsoi

O arquiteto responsável pelo projeto foi Acácio Gil Borsoi (1924-2009), nome fundamental na construção do ideário moderno na arquitetura e urbanismo do Nordeste. Entre seus projetos, destacam-se edifícios altos, residenciais ou institucionais, e experiências de habitação social.

Borsoi ficou conhecido pelo rigor nas proporções e nas diretrizes projetuais, além de detalhes técnicos criativos ao longo de suas obras. O arquiteto foi responsável por outros edifícios icônicos da capital pernambucana, como o Califórnia, erguido no início da verticalização de Boa Viagem nos anos 1950. Também é dele o prédio do Hospital da Restauração, no Derby, na mesma década.

Detalhes de prédio modernista projetado por Acácio Gil Borsoi – – Crédito: Acervo Acácio Gil Borsoi

O atual prédio do NGPD foi construído em uma área de 11 mil metros quadrados, servido por quatro elevadores automáticos. Os seus 20 andares cortaram a paisagem do Bairro do Recife com uma verticalização sem precedentes, juntamente com o Palácio Capibaribe Antônio Farias, sede da Prefeitura do Recife, inaugurado em 1975.

No tempo de sua inauguração, ele contava com uma escada rolante ligando o térreo ao primeiro andar; e um auditório para 180 pessoas no último andar. Os jardins nos terraços e na base foram de Roberto Burle Marx.

Entrada da antiga sede do Bandepe, no Cais do Apolo

Nos anos 1960, Borsoi também assinou projetos modernistas que marcaram o Centro do Recife, como o Bancipe, próximo da Igreja Matriz de Santo Antônio; e o Edíficio Comercial Santo Antônio, no mesmo bairro.

O COMEÇO

O projeto que deu origem à antiga sede do Bandepe tinha um outro propósito: criar uma sede para a Bolsa de Valores de Pernambuco, que até então não tinha um espaço fixo.

Em 2 de outubro de 1960, o Diario de Pernambuco noticiou que a direção da Bolsa dirigiu um convite-circular a todas as empresas construtoras da capital e de outros Estados para a edificação da sede. Ela teria 23 andares, com terreno próprio situado na esquina das ruas Álvares Cabral e Madre de Deus, com área de 6.800 m².

Planta da antiga sede do Bandepe, por Acácio Borsoi – Crédito: Acervo Acácio Borsoi

Essa sede da Bolsa não avançou e, apenas nos anos 1970, a organização foi para o antigo prédio do Banco de Londres, próximo do Marco Zero do Recife. Contudo, em 1969, o Bandepe reaproveitou as fundações do edifício.

Foram implantados dois blocos: a torre, aproveitando as fundações e gabarito aprovado; e um acréscimo mais baixo lateral para a área financeira do banco e uma garagem mecânica. O cálculo estrutural foi do engenheiro Joaquim Cardozo. 

O Bandepe

Anúncio em jornal na ocasião da inauguração da nova sede do Bandepe, em 1970 – Crédito: Diario de Pernambuco

Em 1938, foi fundada a Caixa de Crédito Imobiliário de Pernambuco, embrião do Bandepe. A iniciativa foi instalada no antigo prédio do The British Bank of South America, também localizado próximo do Marco Zero (e que foi sede da empresa In Loco na década passada).

O rápido crescimento do banco, sobretudo no final dos anos 1960, resultou na construção da sede do Cais do Apolo. Na inauguração, o banco já tinha 32 anos de atuação no Estado. O edifício representou o amadurecimento de uma instituição bancária que vinha fortalecendo a economia local.

Projeto do Bandepe, idealizado em 1969

O banco atuava na instrumentalização financeira de inúmeros programas de investimentos públicos, nos setores de infraestrutura (estradas, saneamento, mecanização agrícola, irrigação, etc) e na assistência creditícia às comunidades do interior. O crédito agrícola se expandiu através do crescimento da rede de agências.

A sede do Cais do Apolo atendeu padrões de funcionalidade capazes de resolver os problemas que vinham estrangulando e comprometendo o desenvolvimento da instituição. Nesse período, o prédio projetado por Borsoi passou a centralizar todas as suas diretorias e respectivos serviços que demandavam a ocupação de cinco prédios distintos e situados em lugares diversos.

Inauguração

Notícia sobre visita de jornalista ao Bandepe, em junho de 1970

Uma vez finalizada, a nova sede do Bandepe transmitia uma certa imponência pela sociedade. Em 23 de junho de 1970, a nova sede do Bandepe foi apresentada a jornalistas do Estado. Assim registrou o colunista João Alberto, do Diario:

“O prédio, que causa tão boa impressão de fora, surpreende internamente; tudo é revolucionário e de luxo. O que tem uma explicação bem lógica, é um projeto de Acácio Gil Borsoi, um jovem que ocupa, indiscutivelmente, posição de liderança na arquitetura nordestina”, diz uma nota publicada.

“Desde o local de atendimento ao público até a sala da presidência, tudo é sensacional, causando um impacto dos mais positivos. A nova sede é apenas o reflexo de um Banco que cresceu astronomicamente nos últimos anos, deixando de ser uma Caixa de Crédito para ser um pujante Banco, presente nas mais importantes cidades do Estado.”

José Aristophante Pereira, presidente do Bandepe, na inauguração (1/7/1970 – Crédito: Diario de Pernambuco

A excêntrica proposta de um edifício moderno no mais antigo bairro do Recife já antecipava o seu uso no futuro, sendo sede. Em 1998, o banco holandês ABN-Amro Bank comprou o Bandepe por R$ 182,9 milhões.

Ainda na virada do milênio, a necessidade da criação de uma nova agenda para a economia em Pernambuco fez com que o antigo prédio passasse a abrigar a gestão do parque tecnológico, que hoje está espalhado por diversas propriedades do Recife Antigo e também de Santo Amaro, Santo Antônio e São José.

Emannuel Bento é jornalista pela UFPE, com passagens pelo Diario de Pernambuco e Jornal do Commercio

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