O último fim de semana foi bastante agitado nos cinemas do mundo com o lançamento de duas superproduções, Barbie e Oppenheimer. Estima-se que, no período, o faturamento da bilheteria dos filmes no primeiro fim de semana  foi de US$ 400 milhões e US$ 200 milhões mundialmente, respectivamente. As obras estão bem avaliadas pela crítica e são ótimos programas para o que resta das férias escolares – se bem que nenhum deles tem foco no público infantil. 

Vamos falar aqui da temática de gerenciamento de projetos – tão importante para o contexto da área de tecnologia – inspirados no filme Oppenheimer. Prometemos não dar spoilers, somente trazer alguns aspectos históricos que são de domínio público.

Filme sobre a vida de James Robert Oppenheimer foi dirigido por Christopher Nolan teve estreia mundial no dia 20 de julho

Gerenciar projetos é uma das principais competências para qualquer trabalho atualmente e boa parte das competências preconizadas para as pessoas gerentes de projetos pelo Project Management Institute (PMI) estão listadas dentre as 10 habilidades mais importantes dos profissionais, segundo o relatório “Future of Work 2023” do Fórum Econômico Mundial. Dentre elas, destacamos: pensamento analítico, senso crítico, resiliência, flexibilidade, agilidade, motivação, empatia, literácia tecnológica, liderança e influência social. Não é a toa que a maior parte das vagas de trabalho, especialmente no mercado de trabalho de tecnologia, demandam essas habilidades, seja na abordagem tradicional ou nas ágeis.

Uma pessoa gerente de projetos precisa ter habilidades para gerenciar diferentes aspectos de um projeto – escopo, tempo, custos, riscos, qualidade, recursos, aquisições, comunicação, engajamento das partes interessadas e mudanças – além da liderança da equipe, segundo preconizado no Corpo de Conhecimento de Gerenciamento de Projetos do PMI (PMBOK), que está na 7a edição. Vamos falar sobre isso de forma indireta, tendo como pano de fundo uma das histórias mais icônicas do século passado, a história da bomba atômica?

O filme Oppenheimer retrata momentos da vida de James Robert Oppenheimer, cientista responsável pelo Projeto Manhattan, o qual criou a primeira bomba atômica da história. Robert era um intelectual, dotado de uma inteligência destacável, altamente sociável e tinha uma consciência política, o que gerou questionamentos a ele no pós-guerra. O filme foi dirigido por Christopher Nolan, um dos mais renomados diretores de cinema do século XXI, responsável por uma série de obras primas em seu portfólio como Amnésia, a trilogia Batman Cavaleiro das Trevas, a Origem, Interestelar, Dunkirk, entre outros.

Nolan tem um jeito particular de contar histórias, abordando temas complexos e usando com maestria o storytelling para manter a audiência entretida em filmes longos de três horas de duração como, por exemplo, em Interestelar. Esse filme conta a história de uma equipe de astronautas que viajam em uma missão exploratória de outros planetas, abordando conceitos complexos como buracos de minhoca, buracos negros e a teoria da relatividade.

Em Oppenheimer, Nolan conta a história de Robert Oppenheimer, trazendo aspectos da vida do cientista desde a sua formação acadêmica até anos após o lançamento das bombas sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, que causaram mais de 200 mil mortes – direta e indiretamente

Bombas lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki foram fundamentais para a rendição do Japão, que lutava ao lado da Alemanha

Estima-se que o Projeto Manhattan custou da ordem de US$ 2 bilhões segundo o levantamento da Statista mostrado no gráfico a seguir. Estima-se que a equipe do projeto mobilizou, no seu pico, em torno de 130 mil pessoas e 31 participantes do mesmo foram agraciados com o Prêmio Nobel, antes e depois do evento, mas Oppenheimer não… Ou seja, Robert não era o cientista de maior destaque acadêmico do projeto mas, mesmo assim, foi designado para ser o responsável pela condução do mesmo. Essa escolha fazia sentido?

Statistic: Cumulative costs of the Manhattan Project until December 31, 1945, by facility (in 1,000s of U.S. dollars) | Statista

Sim, com certeza! O reconhecimento acadêmico é um fator importante, entretanto, para conduzir um projeto complexo como o Manhattan, havia uma série de outras competências importantes e “não acadêmicas”, as quais representavam um grande desafio para qualquer gestor. Só para contextualizar, uma cidade foi construída no meio do deserto do Novo México para abrigar a equipe e seus familiares para manter o ambiente restrito com um nível de dedicação integral ao projeto.

Há quem diga que se não fosse Oppenheimer à frente do Projeto Manhattan, a bomba não teria ficado pronta no período da guerra, conforme a transcrição de trecho da reportagem de Ben Platts-Mills da BBC Future a seguir:

“Se Oppenheimer não tivesse sido diretor em Los Alamos [o laboratório onde a bomba atômica foi desenvolvida], tenho a certeza de que, para o bem ou para o mal, a Segunda Guerra Mundial teria terminado… sem o uso de armas nucleares.”

A transcrição do artigo é remetida ao livro “Oppenheimer: Portraits of an enigma”, de Jeremy Bernstein, que trabalhou com Oppenheimer no Instituto de Estudos Avançados da Princeton University no pós-guerra. 

Sobre a ótica do gerenciamento de projetos, o filme traz uma série de lições e podemos imaginar os desafios enfrentados por aquela equipe. Primeiramente, o desafio científico de tornar possível a fissão nuclear no núcleo da bomba, o qual demandou um longo período de estudo e experimentos na fronteira do conhecimento. Adicionalmente, havia um grande desafio de liderança, visto que o projeto tinha um conjunto diverso de partes interessadas, desde cientistas agraciados com o Prêmio Nobel até oficiais generais do Exército dos Estados Unidos, passando pela equipe de construção da cidade de Los Alamos.

Oppenheimer e parte de sua equipe do Projeto Manhattan, em Los Alamos (EUA) (Bettmann/Getty Images)

Haviam outros centros, além de Los Alamos, distribuídos pelo país conduzindo etapas importantes nos experimentos e na produção dos insumos para a construção da bomba. Já pensou como é coordenar a comunicação e os trabalhos de equipes nas extremidades opostas dos Estados Unidos, 80 anos atrás, sem internet e as ferramentas de produtividade que temos hoje? Sem contar que o processo de recrutamento e seleção de pessoas tinha uma conexão com a Europa, de onde muitos cientistas foram atraídos.

Nesse contexto adverso, como manter o foco e o engajamento da equipe? Um ponto a ser considerado é o fato do mundo estar em guerra e eles acreditarem que estavam em desvantagem em relação aos nazistas. O instinto de sobrevivência e a luta para derrotar o inimigo na guerra são dois poderosos combustíveis para a criação do propósito da equipe e para ajudar a manter o engajamento dos membros, trabalhando incessantemente em busca do objetivo. No filme, quando Oppenheimer inicia na liderança do projeto, eles acreditam estar entre 12 a 18 meses atrás da equipe alemã, que também era composta por expoentes científicos.

Há quem diga que se não fosse Oppenheimer à frente do Projeto Manhattan, a bomba não teria ficado pronta a tempo

Havia uma série de outros desafios envolvendo riscos e questões éticas sobre a construção da bomba e sobre o uso da mesma. Esse dilema dividiu a equipe e é bem retratado no filme, inclusive cientistas como Albert Einstein se recusaram a participar ativamente do projeto, com receio das consequências do uso indevido da bomba. Esse é um fato que ganhou bastante destaque pois, em 1939, Einstein escreveu uma carta juntamente com Leo Szilárd, para o presidente norte-americano Franklin Roosevelt sobre a possibilidade da Alemanha estar desenvolvendo uma bomba atômica para uso na 2ª Guerra Mundial, o que teria sido um marco relevante para a criação do Projeto Manhattan.

Gerenciar todos os recursos, liderar a extensa e diversa equipe, lidar com uma quantidade significativa de diferentes partes interessadas, lidar com as incertezas, sucessos e fracassos e assumir a responsabilidade pelas consequências foi algo que Oppenheimer fez com sucesso. Além disso, havia questões familiares envolvidas, sendo esse ponto retratado de forma espetacular por Nolan no filme, onde aspectos da relação de Robert com sua família são retratados, mostrando que ele talvez não tenha tido o mesmo sucesso em casa. Mas isso fica para o filme, ok?

Como mostrado, Oppenheimer teve grandes desafios para gerenciar o Projeto Manhattan, desafios que são semelhantes a quaisquer gerentes de projetos convencionais. Aqui no Porto Digital, temos diversas entidades que fornecem capacitação e jornadas de desenvolvimento pessoal na área de gerenciamento de projetos, inclusive com a presença de um capítulo do PMI no ecossistema. Quer saber mais como se desenvolver nessa área, entra em contato com a nossa equipe. Gostou do texto? Quer comentar algum aspecto? Comenta nas nossas redes sociais!

Fernando Sales é professor do Departamento de Engenharia Biomédica da UFPE e pesquisador do Porto Digital

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