O Metrô do Recife (MetroRec) já foi um vislumbre de solução para os problemas de mobilidade na Região Metropolitana. Mais do que isso, o sistema materializou uma ideia de progresso, avanço e protagonismo regional da capital pernambucana, sendo o maior o projeto de transportes do Norte/Nordeste na sua inauguração.
A construção desse metrô de superfície foi o maior projeto do setor na região, tanto pela sua importância (tinha o objetivo de transportar 400 mil passageiros por dia), quanto pelo volume de recursos investidos.
Em agosto de 1982, o ministro dos Transportes do governo João Figueiredo assinou, em Londres, um contrato de financiamento no valor de US$ 238 milhões com o Lloyds Bank, que liderava um consórcio de 30 bancos ingleses, americanos e franceses.
Em seguida, foi assinado um convênio com o consórcio entre as já extintas estatais Empresa Brasileira de Transportes Urbanos e Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima para um sistema que, no início, se chamaria “Trensurb”.
Cerca de US$ 162 milhões seriam para o pagamento das firmas brasileiras encarregadas pela obra; Noberto Odebrecht (obras civis); Aços Villares (sistema de sinalização); STL (sistemas de comunicação) e Santa Matilde (trens). Outros US$ 76 milhões seriam aplicados na compra de materiais ingleses de controle, sinalização e telecomunicação.
Por que construir o metrô?
O Metrô do Recife começou a ser preparado em uma fase de recessão econômica no Brasil. Apesar disso, a eletrificação das vias férreas era vista como uma solução para o transporte em todo o País.
O Grande Recife já tinha uma malha ferroviária, partindo da Estação Central (inaugurada em 1888), que bifurcava em três linhas: Norte (25 km, partindo até São Lourenço da Mata), Centro (17 km, para Jaboatão), e Sul (23 km, para o Cabo). Até aquele momento, 43 mil pessoas viajam por dias nessas três linhas.
Contudo, o trem era cada vez mais visto como obsoleto. Os defeitos da faixa de trilhos eram responsáveis por 53% dos acidentes ferroviários. Existiam deficiências e falhas no sistema no veículo, na infraestrutura, nas instalações e na sinalização.
Mas por que um metrô de superfície? É comum ouvir, por exemplo, que o Recife não poderia ter metrôs subterrâneos por fatores naturais (como a presença de águas subterrâneas).
Na verdade, o argumento na época era de que o modelo de superfície implicava em um custo bem mais baixo e seguro. Ele era vendido como a melhor opção de transporte urbano nas grandes cidades, diminuindo em até uma hora o tempo de viagem gasto, em média, pelos habitantes.
Outro argumento era a situação geográfica dessa área da cidade, que é totalmente plana, dispensando, assim, obras subterrâneas que demandam mais recursos.
A verdade é que o Metrô do Recife reaproveitou a linha Centro, da Estação Central até a Edgar Werneck (posteriormente, apenas Werneck), desativando todo esse trecho para reformas. Foram contratados 15 ônibus para que os usuários não ficassem desassistidos.
Tecnologia
Iniciadas em janeiro de 1983, as obras geraram cinco mil empregos diretos. Na primeira etapa, foram construídos 16 viadutos, 17 estações de passageiros e sede administrativa – a estação Werneck foi chamada de “Coração do Metrô”.
Todo o seu sistema de computação foi nacional, respeitando e cumprindo a política adotada pela Secretaria Especial de Informática, que reservava o mercado de micro computação para as indústrias nacionais.
Os trens do metrô foram construídos no Rio de Janeiro, pela Companhia Industria Santa Matilde, sendo importados da Inglaterra alguns motores elétricos de atração e o equipamento de segurança.
Da Alemanha foram importados os truques, engates e parte do equipamento de freios. A indústria nacional também forneceu alguns motores e outros equipamentos elétricos.
Na época, dizia-se que esses trens seriam protótipos para unidades ferroviárias de futuros sistemas de outras capitais. A técnica utilizada foi alemã, da Deustsche Geselischaft fuer Technisj Zuammenarbeit, especializada em projetos de cooperação técnicos e de desenvolvimento sustentável em escala mundial.
Sensação
Nas vésperas de sua inauguração, que ocorreu em 11 de março de 1985, o Metrorec atraía atenção de todos os segmentos do Estado. Desde políticos a profissionais liberais e empresários, que visitavam regularmente as suas obras.
Em carta natalina para o presidente do Metrorec, o engenheiro Emersono Jatobá, Gilberto Freyre escreveu o seguinte trecho:
“Os metrôs que vão servir ao recifense não são somente máquinas de levar gente de um lugar a outro. São máquinas dotadas de sensibilidade. Responsáveis pelo que fazem. Pelo quase silêncio de sua velocidade. pela segurança dos passageiros que confiam neles. Mais responsáveis do que os antigos trens, embora não se deva deixar de agradecer a Deus, pelos velhos trens, avós nos nossos metrôs. Bons avós. Serviçais. Prestimosos. Atenciosos. Mas os metrôs excedem os trens antigos nessas virtudes. Não são apenas menos barulhentos. São mais seguros de si mesmo e da doçura de suas velocidades…”.
Os compositores Capiba e Luiz Bandeira fizeram até frevos para a inauguração: “Trem de Ferro” e “Vamos de Metrô”, respectivamente.
Se teve um medo, inclusive, de que a valorização das áreas do metrô afastassem os usuários de baixa renda (público alvo do transporte), o que poderia tornar os trens elétricos ociosos. Isso não ocorreu.
Contudo, a adesão inicial não foi nada comparado ao esperado. Funcionando apenas entre a Estação Central e Werneck, o número de usuários não passava de sete mil por dia. Isso ocorreu por falta de execução de um sistema de integração com ônibus, o que foi feito posteriormente.
A linha foi expandida até Jaboatão em 1986. A partir de então, o metrô passou por várias fases. Em 1998, foram iniciadas as obras de expansão da linha centro, a partir da estação Rodoviária até Camaragibe e a eletrificação de 14,3km da linha sul, entre as estações Recife e Cajueiro Seco, com nove estações.
Hoje, o sistema enfrenta uma crise financeira e estrutural há mais de cinco anos, sendo um grande desafio para o poder público. O esforço do passado, com seus erros e acertos, podem servir de inspiração na busca de soluções.
Emannuel Bento é jornalista pela UFPE, com passagens pelo Diario de Pernambuco e Jornal do Commercio
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