Há alguns meses, virou praxe. Logo que recebe o pagamento por seu trabalho como estagiária na Um Telecom, empresa de telecomunicações e soluções em infraestrutura de TI com sede no Recife, Swayne Nascimento faz questão de pegar pela mão o seu irmão, Salomão Wosterlan, de 12 anos, para uma agenda especialíssima. Juntos, aproveitam uma sessão de cinema, escolhem um parque animado para passear e brincar e, ao final, tomam um sorvete de duas bolas. “De chocolate, para os dois”.
Swayne, toda orgulhosa no cumprimento de seu papel, é quem paga pelas despesas. “Amo!”. São dias felizes, sempre desejados e só alcançados graças à primeira oportunidade de trabalho formal, e na área em que ela sempre sonhou estar – a da tecnologia. E graças “às oportunidades de estudo”, cavadas em parte por ela própria como estudante dedicada por anos dos ensinos Fundamental e Médio e pelo incentivo da mãe, Susy. Uma terceira parte deste crédito ela dá à conquista de uma vaga universitária no curso de Análise e Desenvolvimento de Sistemas.
O curso universitário da jovem tem sido feito em universidade privada e é 100% pago pelo município por meio do Programa Embarque Digital, realizado por uma parceria bem-sucedida do Porto Digital e da Prefeitura do Recife. Até agora, cerca de 1.400 mil estudantes já foram selecionados para os cursos de Análise de Desenvolvimento de Sistemas e Sistema em Internet.
Ela está no 4º período de uma faculdade onde frequenta aulas de segunda a sexta, das 8h às 11h. E, por vezes, no sábado. “Temos uma estrutura maravilhosa e muito apoio”. Das cinco disciplinas por semestre desses cursos, uma delas acontece em modelo de imersão, no Porto Digital: Residência Profissional Tecnológica.
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Aos 19 anos, moradora da comunidade de Santo Amaro, limite entre Recife e Olinda, Swayne nunca recebeu qualquer cobrança de participação financeira para o custeio da casa; mesmo assim, faz questão de contribuir. Parte da bolsa fornecida pelo estágio é destinada ao pagamento da conta mensal de internet da sua residência e parte é entregue à mãe, Suzy Conceição, como ajuda para a compra dos mantimentos da feira doméstica.
Os tempos não estão fáceis. O que sobra da conta, ela emprega na compra de bens de consumo típicos de uma jovem vaidosa da idade dela: “Antes, eu montava o carrinho da Shein e deixava lá. Agora, é diferente. Posso comprar”, afirma, citando o famoso site de compras on-line. “Com o meu primeiro salário, comprei um tênis colorido, com rosa e verde-limão. Eu queria muito esse sapato, que é inspirado na Banda Restart. Amo esse tênis; tenho o maior cuidado com ele”, diz, sem esconder o frenesi a respeito do assunto.
É uma realidade nova e festejada por Swayne e família. Santo Amaro, onde mora, é um bairro conhecido pela vulnerabilidade social. Dos colegas de turmas antigas, poucos seguiram no estudo. “Infelizmente, vários saíram da escola por conta da violência”. Swayne e a família resistiram. “Minha mãe trabalha como cuidadora de idosos. Ela sempre sonhou com faculdade para mim e era focada nisso. Eu estudei minha vida toda em escola pública e ela dava um jeito, me colocava em reforço, me ensinava e buscava caminhos para uma educação melhor”.
Já no Ensino Médio, ela se destacou ganhando medalha em concurso de Robótica, quando venceu campeonatos municipais e levou medalha de prata em disputa nacional. “Lembro tanto dessa época… Eu chegava em casa com as medalhas e sempre comemorávamos muito”.
A mãe a estimulou a concorrer a uma vaga para o Embarque Digital. Quando iniciou o curso, houve um esforço coletivo para comprar um notebook, com o objetivo de facilitar os estudos da filha. O fascínio da jovem estudante só aumentou a cada disciplina concluída ao longo do curso. O empenho no início do curso, e a vitória como participantes de grupos em disputas com turmas mais avançadas, lhe renderam visibilidade na faculdade e fora dela, crê a jovem.
Conhecendo o Porto Digital
Swayne não esquece o dia em que foi convidada a falar em público, a convite do Porto Digital, sobre sua experiência. Ficou marcado na memória o dia em que visitou um laboratório no Porto Digital e acabou recebida em um almoço pelo presidente do Porto Digital, Pierre Lucena. “Interagir com ele foi 10. Demais mesmo. Nunca imaginei”.
Entre os colegas da turma e professores da faculdade, é comum se falar de vagas e de canais que ofertam vagas de estágio e trabalho. Usando aplicativos como WhatsApp e Telegram, acessou alguns e conquistou a sua primeira oportunidade.
Na Um Telecom, Swayne atua como analista de dados. Ela ajuda a organizar planilhas e troca informações com vendedores. “Já estou de olho numa vaga que é específica de tecnologia. Me aproximei com o pessoal da área, eles me ensinam muito e eu sinto que estou qualificada para concorrer a esta vaga”. De acordo com o Observatório Núcleo de Gestão do Porto Digital, da turma dela (2021.2), cerca de 53,2% dos estudantes já estão atuando na área de TI.
Swayne é desbravadora e gosta de dar vazão à curiosidade. Seja usando o notebook ou o celular, ao falar de tecnologia em qualquer momento seu olho brilha. O encantamento do momento é quanto ao Chat GPT, de inteligência artificial. Pergunta de tudo à IA – de “coisas aleatórias” a dicas para projetar uma planilha que pode ser aplicada no trabalho. “Agora, tem de saber perguntar porque, senão o ChatGPT embola e responde tudo errado”, explica, com ar de especialista.
Silvia Bessa é jornalista. Gosta de revelar histórias que se escondem na simplicidade do cotidiano. Venceu três vezes o Prêmio Esso e tem quatro livros publicados
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