Os millennials precisam encarar a verdade: seus dias estão contados. A famosa “Geração Y”, que corresponde aos nascidos entre os anos 1980 e 2000 – hoje com seus 20 e tantos a 40 anos – atualmente domina os demográficos, mas a Geração Z vem com força e já está conquistando seu espaço na sociedade e no mercado de trabalho.
Nativos digitais, os jovens também têm uma relação muito diferente com a internet – desde como fazem buscas e usam as redes sociais, até como encaram a privacidade e, especialmente, a falta dela. De acordo com um whitepaper intitulado “Understanding Generation Z”, publicado pela Amazon Payment Services, essa geração, cujo poder de compra cresce a cada dia (já soma US$ 450 bilhões), apresenta preferências e atitudes distintas em relação às gerações anteriores.
O estudo, que entrevistou mais de 1.800 respondentes nos Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita e Egito, revela uma tendência intrigante: membros da Geração Z priorizam, por exemplo, a personalização em detrimento da privacidade. Eles demonstram menos preocupação com o compartilhamento de dados do que gerações anteriores e estão dispostos a compartilhar suas informações se isso proporcionar uma experiência de compra melhor.
Em contraste, millennials que participaram da pesquisa expressaram maior preocupação com o compartilhamento de dados. Essa abordagem da Geração Z em relação à privacidade online se reflete também na forma como eles interagem com as mídias sociais. Cada vez mais, eles preferem chats de grupo fechados e comunidades online mais privadas, como Discord ou o fediverse. Esse movimento sugere uma mudança sísmica na forma como interagimos online – um jogo de esconde-esconde com os anúncios invasivos e a ostentação das redes sociais tradicionais.
Lori Martin, diretora criativa do grupo Innocean, destaca a importância da comunicação bidirecional para os jovens na rede. “À medida que essa base de usuários consumidores continua crescendo em influência, os profissionais de marketing devem manter essa mentalidade de um-para-um em seus anúncios e presença orgânica,” disse ela. Isso reflete uma nova era na publicidade digital, onde a personalização e a autenticidade reinam supremas.
Em resposta a esse cenário, surgiu o que tem sido chamado de “cozy web”, espaços privados online para onde as pessoas se retiraram, locais onde os anunciantes não podem comprar a atenção das pessoas. Uma pesquisa da empresa de insights de audiência GWI revela que o tempo gasto nas redes sociais atingiu um teto, com o tempo diário global nessas plataformas diminuindo. Enquanto isso, o número de usuários móveis do WhatsApp continua crescendo, alcançando dois bilhões de usuários ativos mensais em todo o mundo em fevereiro de 2022, antes de atingir 2,78 bilhões em junho, de acordo com a Statista.
Esse é só um exemplo de como a relação da Geração Z com a privacidade digital é um estudo em contradições. Apesar de uma aparente indiferença em relação às implicações de sua pegada digital, eles também são incrivelmente conscientes e proativos na proteção de sua privacidade online. Isso decorre de uma compreensão intuitiva da internet como uma extensão de suas vidas físicas – que falta em membros das gerações anteriores.
Para muitos, a linha entre os espaços privado e público se tornou significativamente turva, levando a uma abordagem mais aberta e transparente nas interações online. Por isso, a busca por validação social e a necessidade de conectividade dentro dos grupos de pares que já acontecia offline, leva os jovens a compartilhar suas experiências e opiniões pessoais abertamente nas plataformas de mídia social.
A gratificação instantânea vem na forma de curtidas, compartilhamentos e comentários, muitas vezes superando as preocupações sobre possíveis consequências a longo prazo, fomentando uma cultura de expressão imediata e visibilidade. O conceito de privacidade evoluiu para abranger o compartilhamento seletivo, em vez de isolamento completo.
Por outro lado, os jovens são familiarizados com conceitos como publicidade direcionada, mineração de dados, roubo de identidade e exploração online, implicações de uma extensa pegada digital. Gen Zers, mais do que outros demográficos, adotam medidas de proteção online, como limpar cookies, usar navegadores anônimos e criptografar suas comunicações – algumas vezes com o dobro da frequência de outras gerações.
De acordo com um estudo da Dell Technologies, que entrevistou 15.105 pessoas entre 18 e 26 anos de 15 países, mostram que a Geração Z não confia em nenhuma entidade, seja pública ou privada, para manter seus dados seguros online.
Principais pontos do estudo incluem:
– Apenas 18% dos entrevistados confiam em órgãos governamentais para proteger seus dados;
– Somente 17% confiam em empresas do setor privado;
– 25% dos respondentes confiam igualmente em ambos;
– A maior preocupação de segurança cibernética da Geração Z é ter seus dados pessoais ou fotos compartilhados sem permissão.
Além disso, mais da metade dos indivíduos pesquisados expressaram baixa ou neutra confiança de que seus dados pessoais estão sendo armazenados adequadamente por provedores de saúde. Apesar de tomar mais medidas protetivas com seus dados, os cerca de 88% dos jovens se mostram dispostos a compartilhar alguns dados pessoais com uma empresa de mídia social, comparados a apenas 67% dos adultos mais velhos.
De acordo com uma pesquisa da McKinsey, a Geração Z também é mais propensa a assumir riscos online. Mais de 40% dos Gen Zers disseram ter permitido acesso a informações pessoais em troca de benefícios como códigos de desconto ou uso gratuito de um serviço. É comum ainda o uso de funções como “salvar senha” ou “manter-me conectado”, indicando uma maior tendência a armazenar informações sensíveis online.
Essa mesma geração vive em um equilíbrio delicado entre o compartilhamento de dados e a proteção de sua privacidade online. Enquanto eles se beneficiam da personalização e das conexões fornecidas pelas mídias sociais, também enfrentam os riscos de uma pegada digital extensiva. O desafio para empresas e indivíduos é navegar neste terreno complexo, promovendo a alfabetização digital e uma abordagem mais informada e responsável à privacidade online.
Renato Mota é jornalista, e cobre o setor de Tecnologia há mais de 15 anos. Já trabalhou nas redações do Jornal do Commercio, CanalTech, Olhar Digital e The BRIEF
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