Na semana passada, o Senado aprovou o Marco Legal dos Games, uma legislação destinada a regulamentar todos os aspectos da fabricação, importação, comercialização e desenvolvimento de jogos eletrônicos no Brasil. O projeto de lei 2796/2021 agora aguarda a sanção do presidente Lula.
Este marco legal busca não só fortalecer a segurança jurídica para os empreendedores do setor, mas trazer incentivos fiscais e medidas de fomento à essa indústria. Este conjunto de regulamentações representa uma resposta estratégica ao dinamismo e à importância crescente dos games – que têm se destacado não só como uma forma de entretenimento, mas como uma potência econômica e tecnológica em plena expansão.
Em 2022, a indústria de games movimentou mais de US$ 196,8 bilhões globalmente, segundo a PwC, um número impulsionado notavelmente pela pandemia de COVID-19, que obrigou pessoas de todas as idades a buscarem novas formas de lazer dentro de casa. Em 2023, pela primeira vez, o setor ultrapassou a impressionante marca de 3,3 bilhões de jogadores — quase metade da população mundial. Para contextualizar, a indústria cinematográfica, embora tenha tido um ano forte com sucessos como “Barbie”, “Oppenheimer”, e “Super Mario Bros.”, arrecadou pouco mais de US$ 77 bilhões.
No Brasil, essa tendência não é diferente. Segundo a consultoria Newzoo (2023), o País se consolida como o décimo maior mercado de games do mundo, com mais de 100 milhões de jogadores gastando US$ 2,7 bilhões em 2022. Com uma taxa de crescimento médio acumulado de 10% ao ano desde 2020, estima-se que os gastos cheguem a US$ 3,5 bilhões até 2025.
Uma Indústria em Pleno Crescimento
Além de um robusto mercado consumidor, o Brasil testemunha um boom na criação de jogos nacionais. A Pesquisa da Indústria Brasileira de Games da Abragames aponta um crescimento de cerca de 167% no número de desenvolvedoras entre 2014 e 2018, e uma expansão subsequente de 152% até 2022.
Esse crescimento é facilitado pela transição para a distribuição digital dos jogos. A flexibilidade do modelo de trabalho remoto e a terceirização de projetos ampliam as possibilidades de colaboração internacional e otimização de recursos, propiciando um ambiente fértil para a inovação e a diversificação do mercado.
É nesse contexto que foi desenvolvido o Marco Legal dos Games, proposto pelo deputado federal Kim Kataguiri (União-SP). O PL 2796/2021 foi aprovado inicialmente pela Câmara dos Deputados em outubro de 2022 e seguiu para o Senado, onde foi relatado por Leila Barros (PDT-DF). Após uma aprovação em votação simbólica pelo Senado, o texto sofreu modificações e retornou para a Câmara para uma revisão final.
Além de estabelecer um ambiente regulatório para o setor, o projeto inclui uma série de incentivos fiscais e medidas de proteção para crianças e adolescentes no espaço digital.
O Marco Legal dos Games visa:
- Fomentar o Crescimento do Setor: promover a indústria nacional através de diversos incentivos fiscais, como abatimentos de até 70% no imposto de renda para remessas ao exterior que estejam relacionadas à exploração de jogos ou licenciamentos, contanto que haja reinvestimento no mercado de jogos independentes brasileiros.
- Regulamentação da Atividade Profissional: formalizar diversas profissões dentro da indústria, permitindo o enquadramento de profissionais como microempreendedores individuais (MEI). Isso inclui artistas visuais e de áudio, designers de jogos e narrativas, programadores, testadores e produtores.
- Promoção da Educação e Terapia: incentivar o uso de jogos eletrônicos em ambientes educacionais e terapêuticos, seguindo as diretrizes da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e promover a criação de cursos técnicos e superiores voltados para o setor.
- Proteção à Infância e Adolescência: estabelecer sistemas de proteção para mitigar os riscos associados ao consumo de jogos por menores de idade, incluindo a classificação etária indicativa e o controle de microtransações.
Agora é fazer acontecer
Na política, o Marco Legal dos Games já passou de fase e está perto de zerar o jogo. Porém, sua implementação é um novo desafio para o setor. Um dos principais já foi vencido antes da sua aprovação, que foi a exclusão dos fantasy games do projeto, uma decisão que gerou controvérsia e debates intensos. A Abragames, que inicialmente se opôs à inclusão dos fantasy games, viu a exclusão como uma vitória que alinha melhor o projeto com os interesses tradicionais da indústria de videogames.
A expectativa é que com a aprovação do Marco Legal dos Games, o Brasil se posicione melhor como um catalisador de um crescimento substancial na indústria de jogos eletrônicos. Rodrigo Terra, presidente da Abragames, celebra o novo texto como um marco que elimina interpretações equivocadas sobre o setor e abre um horizonte de possibilidades para desenvolvimento econômico nas próximas décadas.
Com incentivos comparáveis aos oferecidos a outras indústrias culturais e tecnológicas, como visto nas políticas da Coreia do Sul e do Canadá, o Brasil tem a oportunidade de aumentar sua fatia no mercado global de jogos, que atualmente é de apenas 0,1% do faturamento mundial. O reconhecimento formal de profissões e empresas dentro do setor não só proporciona segurança jurídica mas também estimula o investimento e a inovação.
Além disso, a lei fomenta o uso de jogos eletrônicos em campos educacionais e terapêuticos, ampliando o impacto social dos jogos e promovendo uma indústria que transcende o entretenimento. As escolas poderão incorporar jogos eletrônicos que se alinhem com a Política Nacional de Educação Digital, e as instituições de saúde poderão utilizar jogos para simulações médicas e terapêuticas, abrindo novos caminhos para a inovação pedagógica e médica.
Em resumo, o Marco Legal dos Games representa uma evolução significativa na maneira como o Brasil percebe e gerencia sua indústria de jogos eletrônicos. Apesar dos desafios na implementação, as perspectivas são amplamente positivas, prometendo um futuro em que o Brasil não apenas participa mas também influencia significativamente o mercado global de jogos.
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