Por Pierre Lucena

Os dados do Censo da Educação Superior de 2023 mostram, com números irrefutáveis, o colapso silencioso do ensino presencial na área de negócios — ao mesmo tempo em que o EAD explode como alternativa dominante.

As tabelas abaixo mostram os dados do Presencial e do EAD, de 2010 a 2023.

No exato sentido oposto, o EAD em negócios passou de 159 mil ingressantes e 356 mil matrículas em 2010 para 1,06 milhão de ingressantes e 1,57 milhão de matrículas em 2023. O número de concluintes saltou de 50 mil para 255 mil no mesmo período. O crescimento é de mais de 560% em ingressantes e 340% em matrículas. Em 2023, o EAD em negócios já representa mais que o triplo do presencial em ingressantes e matrículas.

Em 2010, os cursos presenciais de negócios (retirei Direito na área do MEC) contavam com 467 mil ingressantes, 1,32 milhão de matrículas e 232 mil concluintes. Em 2023, o cenário é desolador: apenas 201 mil ingressantes, 514 mil matrículas e menos de 98 mil concluintes. Uma queda de mais de 50% em pouco mais de uma década. Podemos ver que a pandemia foi um fator de mudança estrutural na curva e o gráfico não deixa dúvidas: a curva é ladeira abaixo, sem reversão à vista.

Mas é preciso fazer um alerta importante: a maior parte dos cursos EAD de negócios no Brasil tem qualidade muito baixa. São formações rasas, baseadas em apostilas genéricas, vídeo-aulas mal produzidas e avaliações que pouco exigem. Muitos desses cursos (não todos) são oferecidos por instituições que priorizam escala e lucratividade, não aprendizagem. O EAD virou, para uma parcela crescente do sistema, um modelo industrial de ensino empacotado — distante de qualquer proposta pedagógica consistente. E mesmo assim, ainda assim, é visto como uma opção “melhor” (ou menos pior) do que o presencial tradicional. Isso mostra o tamanho da crise.

Esses números não significam apenas uma mudança de plataforma. Revelam uma ruptura de modelo. O aluno de hoje não quer mais o pacote tradicional: campus isolado, aulas teóricas desconectadas da realidade, pouca interação e quase nenhum preparo prático. O que vemos é a consequência de anos de descolamento entre o que é ensinado e o que o mundo real exige.

Como escrevi antes: o modelo de formação universitária se esgotou quando falamos de ensino presencial na área de negócios. E o EAD, com todos os seus defeitos, virou o “plano B” de uma geração que já entendeu que não dá mais para perder tempo com um presencial que aparentemente não entrega (pelo menos esta parece ser a percepção). O problema não é apenas de formato. É de sentido. O ensino presencial perdeu o propósito — e o EAD está ocupando esse vazio.

Mas isso não é uma boa notícia. Estamos apenas migrando de um modelo ultrapassado para outro que ainda repete muitos dos mesmos vícios. O que os dados gritam é a urgência de uma reinvenção completa do ensino de negócios no Brasil: mais projetos reais, mais mentoria, mais conexão com o mundo, mais flexibilidade — e menos aula por aula.

O futuro do ensino de negócios não será salvo pela nostalgia do presencial nem pela escala do EAD. Ele será salvo se voltarmos a ensinar com propósito.

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Pierre Lucena é presidente do Porto Digital e Professor da UFPE

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