A recente greve dos roteiristas em Hollywood, que durou cinco meses, trouxe à tona uma questão crucial para a era moderna: como a Inteligência Artificial (IA) generativa deve ser regulamentada em profissões criativas? O acordo alcançado entre a Writers Guild of America (WGA) e os estúdios de Hollywood não apenas resolveu a paralisação, mas também estabeleceu diretrizes sobre a integração ética da IA no mundo criativo.

Um ponto importante a se destacar é que o acordo firmado pela WGA não busca banir ou limitar drasticamente o uso de ferramentas de IA, como o ChatGPT. Ao contrário, ele reconhece o potencial dessas tecnologias em aumentar a produtividade e a qualidade do trabalho dos roteiristas e escritores, enquanto assegura que os benefícios gerados sejam compartilhados de maneira justa com os criadores humanos.

“O acordo dos redatores mostra que, com a estratégia certa, os sindicatos podem garantir uma voz na forma como novas tecnologias como a IA são implementadas no local de trabalho”, disse Adam Seth Litwin, professor de relações industriais e trabalhistas na Universidade Cornell ao Tech Brew. “Em vez de resistir abertamente às mudanças tecnológicas, os sindicatos devem concentrar-se em moldar a sua implantação e garantir que os trabalhadores partilhem os benefícios.”

ia generativa
Fabebk/Wikimedia Commons

A IA como complemento, não substituto

Uma das cláusulas centrais do acordo é que a IA, por mais avançada que seja, não pode substituir a singularidade e a criatividade do criador de conteúdo humano. A tecnologia pode ser uma ferramenta valiosa, mas não pode ser creditada por trabalhos criativos. Esta distinção é crucial para garantir que os escritores mantenham a autonomia e a liberdade em seu processo criativo: escritores têm a liberdade de escolher se desejam ou não utilizar a IA, e os estúdios não podem impor o uso dessas ferramentas.

Além disso, o acordo estabelece diretrizes claras sobre a transparência no uso da IA. Os estúdios devem informar os escritores quando o material fornecido foi gerado por IA, garantindo uma colaboração aberta e honesta entre humanos e máquinas. No documento, ainda houve uma concessão: scripts feitos por roteiristas humanos poderão ser usados pars alimentar o desenvolvimento de IA e para treinar novos modelos geracionais.

Inteligência artificial
Foto: PC Pereira/Porto Digital

Inovação e ética na era da IAGen

Anton Korinek, da Universidade da Virgínia, observa que ainda estamos nos estágios iniciais de compreender o impacto da IA generativa. “O acordo da WGA é um passo significativo, mas ainda há muito a aprender e negociar à medida que mais setores começam a integrar a IA em seus processos criativos”, disse. “Essas diretrizes são fundamentais para garantir que a IA seja utilizada de maneira ética e responsável, protegendo tanto os criadores quanto os consumidores de conteúdo”, completa.

O assunto foi tema, inclusive, na Assembleia Geral das Nações Unidas, no fim de setembro. Amandeep Singh Gill, o Enviado do Secretário-Geral para Tecnologia, afirmou que a IA pode ser crucial para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) até 2030.

Dentro da ONU, ele irá liderar um grupo que terá a tarefa de explorar o potencial da IA na realização dessa meta, identificando também os riscos associados e propondo recomendações e salvaguardas para mitigar seus impactos adversos, como o aprofundamento das divisões de gênero.

Estabelecendo o padrão para o futuro

O acordo entre a WGA e os estúdios de Hollywood é mais do que apenas uma resolução de greve; é uma visão do futuro da criatividade na era da IA. Ele estabelece um padrão para como a tecnologia pode ser integrada de forma ética e justa, garantindo que os benefícios sejam compartilhados e que a voz humana nunca seja silenciada. 

À medida que avançamos para um mundo cada vez mais influenciado pela IA, acordos como este serão cruciais para garantir que a tecnologia e a humanidade coexistam harmoniosamente.

Renato Mota é jornalista, e cobre o setor de Tecnologia há mais de 15 anos. Já trabalhou nas redações do Jornal do Commercio, CanalTech, Olhar Digital e The BRIEF

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