Na faixa “Meus Filhos, Meu Tesouro” do (clássico) álbum ‘África Brasil’, de Jorge Ben Jor, o eu-lírico do músico pergunta aos seus filhos, Artur Miró, Anabela Gorda e Jesus Correia, o que cada um quer ser quando crescer. O primeiro responde “jogador de futebol”, a segunda manda “dona de casa atuante ou mulher de milionário” e o terceiro finaliza com “tesoureiro-presidente ou liberal como você”.

Se Ben Jor refizesse a pergunta hoje, certamente um dos três responderia “influenciador digital”. 

A profissão de criador de conteúdo online vem se tornando um dos sonhos dourados da nova geração. Segundo uma pesquisa da Morning Consult, 57% dos jovens da Geração Z nos Estados Unidos (os nascidos entre 1997 e 2012) se tornariam influenciadores se tivessem a oportunidade, e 30% até investiriam financeiramente para isso acontecer. 

Quando perguntados “o que querem ser quando crescer”, a maior parte dos entrevistados numa pesquisa da Harrys Pool respondeu Youtubber/Vlogger (29%), superando carreiras mais tradicionais como professor (26%), atleta profissional (23%), músico (19%) e astronauta (11%). 

Um relatório mais recente da Morning Colsult ainda revela que quase 60% dos jovens entre 13 e 26 anos, ativos nas redes sociais, trocariam seus empregos atuais para se tornarem influenciadores digitais. Para 53% deles, essa é uma carreira respeitável, e a possibilidade de ganhar dinheiro postando fotos e vídeos é tentadora. O que está por trás desse fascínio?

Digital influencer

Para essa geração, nativa digital, o contato com os influenciadores começa desde cedo. Dados do Cetic.br mostram que mais de 20% dos jovens brasileiros acessam a internet antes dos seis anos de idade. E por aqui somos celeiro de influenciadores: um levantamento da Nielsen Media Research aponta que mais de 500 mil pessoas já trabalham como creators, cada uma com pelo menos 10 mil seguidores. A Rede Snack, por sua vez, indica que dos 6 milhões de influenciadores digitais no mundo, 313 mil estão no Brasil.

A questão é que muito desse “glamour” que os influenciadores passam nas suas redes, é fachada. Uma pesquisa recente divulgada pelo site Statista em janeiro delineou o panorama financeiro dessa profissão tão desejada: cerca de 30% dos influenciadores brasileiros recebem menos de R$ 3,5 mil por mês, enquanto 21% têm ganhos mensais entre R$ 5 mil e R$ 7 mil. Apenas uma elite digital, representada por 0,9% dos entrevistados, consegue ultrapassar a cifra dos R$ 400 mil mensais.

O ecossistema digital é diverso e segmentado. Os mega influenciadores, indivíduos com mais de 1 milhão de seguidores em pelo menos uma rede social, como Virgínia Fonseca e Felipe Neto, representam a ponta do iceberg. Logo abaixo, temos os macro influenciadores, com uma audiência robusta que varia de 500 mil a 1 milhão de seguidores. Esses profissionais têm uma presença digital significativa, mas sem o mesmo brilho e alcance dos seus pares mais influentes.

Os micro e nano influenciadores completam o espectro. Os primeiros, com uma base de 10 mil a 500 mil seguidores, e os últimos, com um público entre 1.000 e 10 mil seguidores, representam a maioria silenciosa e trabalhadora desse universo. São vozes autênticas e nichadas, muitas vezes mais próximas e engajadas com suas comunidades. Já falamos bastante desse pessoal aqui mesmo no Jornal Digital

Contudo, é possível encontrar espaço nesse mercado por trás das câmeras e dos posts patrocinados. Edney Souza, em si um dos primeiros influenciadores digitais do país, e que hoje é professor de marketing digital na ESPM, aponta que há pelo menos 84 empresas no Brasil atuando como intermediárias entre marcas e influenciadores, criando novos cargos e funções. 

Uma delas, por exemplo, é o gestor de comunidade e relacionamento, responsável por estabelecer e manter a ponte entre marcas e influenciadores. Este profissional é crucial para criar e sustentar relações frutíferas entre as partes, garantindo que ambos os lados alcancem seus objetivos de maneira eficaz e harmoniosa. Outra carreira em ascensão é a de produtor de conteúdo digital, especializado em criar textos otimizados e atrativos para a web. Esses profissionais são fundamentais para elaborar mensagens coerentes e persuasivas, que ressoem com o público-alvo e fortaleçam a presença online das marcas.

Além disso, o mercado também abriu espaço para o analista e gerente de mídia digital, que negocia a contratação de influenciadores e acompanha de perto o desempenho das campanhas online. Eles trabalham em conjunto com criadores de conteúdo para desenvolver campanhas que se alinhem à imagem da marca e às expectativas do público.

A demanda por esses profissionais é tão grande que empresas especializadas, como Squid, Spark, Incast, Digital Stars e Celebryts, têm investido em talentos capazes de navegar com destreza pelo universo dos influenciadores digitais – uma espécie de sommelier de youtubers. Para se destacar nesse mercado, é essencial possuir um perfil analítico e técnico, ter capacidade de aprendizado acelerado, familiaridade com redes sociais e experiência em análise de dados. 

Portanto, o boom dos influenciadores digitais não apenas transformou o cenário da comunicação online, mas também gerou um ecossistema de carreiras promissoras e desafiadoras. Para aqueles que desejam ingressar nesse campo, o futuro pode reservar oportunidades inovadoras.

Renato Mota é jornalista, e cobre o setor de Tecnologia há mais de 15 anos. Já trabalhou nas redações do Jornal do Commercio, CanalTech, Olhar Digital e The BRIEF

Comments are closed, but trackbacks and pingbacks are open.