Negócios britânicos, atividades diplomáticas, empresariais e bancárias passam pela história do prédio de número 215 da Avenida Marquês de Olinda, bem na esquina com a Rua Madre de Deus, no Bairro do Recife.
Com 1800 m² de construção, o imóvel marca o segundo texto da série “Memórias no Concreto: Histórias de Prédios do Bairro do Recife“, publicada no Jornal Digital para relembrar as práticas econômicas e sociais que marcaram essa região no século passado. Confira o primeiro texto.
A Av. Marquês de Olinda foi projetada para ser uma das mais nobres vias da ilha nos “Planos de Melhoramentos e Reforma do Porto e do Bairro do Recife” (1909 e 1926), que teve como inspiração as reformas urbanas de Paris no século 19.
Por isso, os sobrados de arquitetura eclética dessa avenida assistiram a passagem de inúmeras empresas e profissionais liberais que alugaram ou compraram salas. O imóvel de número 215 é um bom exemplo disso.
Negócios britânicos
O logradouro “Marquês de Olinda, 215” já aparece nas páginas de jornais antigos em 1923, antes mesmo da conclusão dos “Planos de Melhoramentos e Reforma”, mostrando como esses sobrados eram concorridos no mercado imobiliário.
Nessa primeira década, o prédio abrigou o escritório da Machine Cottons Limited, multinacional do ramo da tecelagem que tinha sede em Glasgow, no Reino Unido.
Os negócios britânicos tinham forte presença no Recife desde o século 19, quando os portos do Brasil foram abertos para estrangeiros. Ao longo daquele século, empresas inglesas prestaram serviços como abastecimento de água, iluminação e transporte.
A Machine Cottons foi um exemplo dessa presença no Bairro do Recife, que também teve empresas como Bank of London & South America (prédio da Caixa Cultural) e da Western Telegraph Company (atual prédio do museu Paço do Frevo).
Apesar desse escritório no Recife urbano, era no interior que a Cottons tinha as suas indústrias. Hoje, essa empresa é lembrada por ter sufocado o desenvolvimento industrial no Nordeste.
No começo do século 20, o industrial Delmiro Gouveia, que começou sua carreira no Porto do Recife, fundou um complexo industrial inovador no interior de Alagoas após deixar a capital pernambucana. O sucesso do empreendimento nacional “Estrela” despertou a atenção da escocesa, que iniciou um processo de perseguição à concorrente brasileira. Após a morte de Gouveia, os britânicos jogaram o maquinário da estrela no Rio São Francisco.
Outra empresa estrangeira que funcionou nesse prédio foi a Siemens-Schuckert, de engenharia elétrica alemã com sedes nas cidades de Berlin, Erlangen e Nuremberg. Ela foi incorporada à Siemens em 1966.
Atividades diplomáticas
Na década de 1940, funcionava no 215 da Marquês de Olinda o Consulado de Portugal no Recife – atualmente existem um Vice-Consulado do país em Boa Viagem, na Zona Sul.
Naquela década, Portugal celebrava aniversários de datas importantes de sua história: Fundação (1143) e o da Restauração da Pátria (1640). Por isso, o governo português decidiu realizar o recenseamento da população lusitana fora do país e foram enviados boletins em todo o globo.
Em Pernambuco, esse recenseamento foi realizado justamente neste prédio. Outros locais disponíveis para essa finalidade eram o Gabinete Português de Leitura, Hospital Português e Clube Português – todos eles existem até hoje.
Por sediar o consulado, o prédio recebeu autoridades como o cônsul Mário Duarte, que também era futebolista e sócio fundador do Clube de Futebol Os Belenenses, em 1947.
Intensa atividade econômica
Na década seguinte, o prédio abrigou escritórios de empresas a Itapessoca Agro Industrial SA, então maior fábrica de cimento instalada no Nordeste do Brasil.
A Itapessoca havia foi criada por João Pereira dos Santos, em 1951, para fabricar o Cimento Nassau – atualmente, o Grupo João Santos tem sede no prédio espelhado do Marco Zero do Recife.
Nesse período, o prédio também abrigou a Associação dos Industriais de Produtos de Cimento do Estado de Pernambuco a partir dos anos 1960.
Nos anos 1970, o prédio virou uma agência do Banco União Comercial (BUC), que foi assumido pelo Banco Itáu, em 1974, que ali teve uma agência até os anos 2000.
Desde 2013, pertence ao Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (Cesar), uma das principais instituições do atual ecossistema de inovação do Bairro do Recife, ao lado do Porto Digital, e aguarda uma incorporação às novas atividades do Bairro do Recife, que atualmente abriga o maior parque tecnológico em área urbana e aberta do Brasil.
Na próxima matéria da série “Memórias no Concreto: História de Prédios do Bairro do Recife”, iremos explorar outro edifício que, como este, ajuda a contar um pouco da rica trajetória desse bairro.
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